OS GENES E NÓS


Os genes, unidades fundamentais da hereditariedade, poderiam transmitir apenas a informação suficiente para especificar as características mais gerais do cérebro, mas a sofisticada construção que faz de nós o que somos vem precisamente da experiência da vida. Os neurónios formam continuamente novas ligações, chamadas 'sinapses', com outros neurónios, amplificando os circuitos necessários para nos orientarmos no labirinto da vida.

O cérebro humano é uma maravilha natural que nos confunde o espírito. É constituído por cem mil milhões de células nervosas, protegidas (e alimentadas) por perto de três milhões
Os Genes e Nós - Raquel Pimentelde milhões de células de apoio. E saindo de cada neurónio há um delicado 'cabo de comunicação', chamado axónio, que se ramifica e torna a ramificar, como a ramagem de uma árvore, permitindo que a célula de origem envie as suas mensagens, através de ligações sinápticas, para milhares de outras do seu tipo. Segundo o neurobiólogo do Massachusetts Institute of Technology - MIT, H. Robert Horvitz, identificar os sinais químicos que guiam os axónios tem sido uma espécie de procura do Graal. No total, existem mais ligações sinápticas dentro de um único crânio do que estrelas no universo. A verdadeira essência do cérebro é esta maleabilidade, e é esse facto que deixa céticos muitos biólogos quando alguns sociólogos e psicólogos afirmam - como o fizeram Richard J. Herrnstein (1930-1994) e Charles Murray no seu livro, The Bell Curve (A Curva do Sino) - ter encontrado provas de que a qualidade a que chamamos 'inteligência' é essencialmente inata.

Se fosse possível, como nas histórias de ficção científica, «teleportar» um ser humano para outro planeta, a forma mais simples e eficiente seria transmitir os códigos genéticos - as compactas sequências de instruções para (re)criar rins, pulmões, coração, fígado, pâncreas, músculos, ossos, olhos, etc. - e usá-los para reconstruir um homem ou uma mulher. Mas este plano falharia irremediavelmente no que diz respeito ao complexo órgão, sempre em evolução, que é o cérebro, pois. Ao contrário dos restantes órgãos, o cérebro está desenhado de forma a modificar-se, ou, melhor dizendo, adaptar-se através da experiência, moldando-se continuamente ao mundo exterior.

Raquel Pimentel - Website: The Bell CurveO referido livro teve grande repercussão e desencadeou de imediato acesa polémica nos Estados Unidos, refletida, por exemplo, em três longos artigos no The New York Times, em que são apontadas as inconsistências teóricas e científicas dos dois sociólogos. Em resumo, Herrnstein e Murray afirmam que, geneticamente, a raça branca é mais inteligente que a raça negra, por exemplo, baseando-se em análises estatísticas de testes psicológicos e de quocientes de inteligência (QI). The Bell Curve veio alimentar as fogueiras do racismo e desencadear fortes reações, mas o facto é que, do ponto de vista científico, pouco ou nada vale, porque os seus autores ignoraram tudo o que faz do cérebro um extraordinário mecanismo e, sobretudo, a superior capacidade de adaptação. Além do mais, e como bem se sabe, os testes de QI são perfeitamente inadequados, cientificamente incorretos e nada mais revelam que os preconceitos e «certezas» de quem os elaborou. Não tenhamos dúvidas que se fosse possível a uma tribo selvagem fazer passar «brancos civilizados» por um QI baseado na organização social e conhecimentos da tribo, o branco certamente seria classificado como um imaculado idiota.

Tanto num caso como noutro, o Homem considerado são, porque é pessoa, não se entregaria a outro homem que pudesse considerá-lo como coisa sua (inferior). Seria regressar a uma conceção pagã da autoridade, em virtude da qual o antigo 'senhor' possuía seus escravos pelo mesmo título que suas tropas ou terras. Este 'refinamento' do sistema humano continua pela vida fora, e é por isso que as pessoas conseguem dominar novas disciplinas ou produzir ideias revolucionárias até à velhice.


Dicas sobre Entrevistas (os erros)

Nos últimos quinze dias decorreu uma série de entrevistas relacionadas com a admissão de pessoal. A iniciativa esteve dirigida a licenciados em diversas áreas. Para ser precisa, não estou autorizada a fornecer detalhes sobre o assunto. Pelo que, como assistente desse processo, adaptando e dirigindo este post aos mais novos, vou somente tentar 'examinar', sob firme base teorética, alguns erros penalizadores - considerados grosseiros - cometidos por parte de um importante número de candidatos. Com isto apenas espero contribuir no sentido de ajudar a detetar ou analisar hábitos que devem ser trabalhados ou abandonados. Este contributo é válido para qualquer nível ou cargo, não exigindo, necessariamente, a posse de qualquer licenciatura. Cabe ao leitor decidir, sob a sua própria reflexão, em que medida os exercícios descritos neste exposto constituem, para si próprio, uma orientação aplicável.

Falta de convicção


Quando uma pessoa, neste caso candidata, determina o fim que pretende atingir, deve descrevê-lo com clareza. Os gregos da antiguidade consideravam a retórica como uma questão de plausibilidade e não de verdade. O que exaltava era a clareza da dicção e não o valor dos juízos. Sócrates, no entanto, disse que o objetivo mais importante era a verdade, e Aristóteles definiu a retórica como a arte de persuadir um auditório que não pode captar de relance um grande número de argumentos. É talvez melhor dizer que a retórica, tendo por objetivo a persuasão, utiliza, para atingir um determinado fim prático, tanto a verdade científica como a emoção genuína, de modo que faz uma (aquela) combinação da verdade e da persuasão. Não existem milagres nesta tese, a determinação e o sucesso da ideia principal de um discurso exige que se conheça o assunto e bastante bem o método capaz de produzir nas pessoas o efeito desejado.

Dicção deficiente


Para determinadas empresas, muitos são os incautos que se esquecem que a distância (aparentemente natural) que separa o entrevistado do entrevistador é meticulosamente estudada. Os indícios são bastante elementares. Nestes casos, as características da mobília utilizada proporcionam ao candidato um agradável conforto talvez, para além de fixarem as marcações predefinidas. Este método é habitualmente usado para estabilizar distâncias quando a análise centra-se na expressão vocal. Se acha que esta avaliação apenas se destina a locutores, atores e restantes profissionais cuja atividade culmina nos dotes vocais, desengane-se. A simples fala de um indivíduo (linguagem, projeção, dicção, respiração, etc.), quando submetido a um questionário presencial, fornece muitas e preciosas respostas. Um olhar atento à nossa linguagem corporal também revela, nestas ocasiões, muito sobre nós mesmos. No post «A linguagem do corpo» encontrará o significado de alguns dos gestos e posturas mais habituais ao longo de uma conversa. Em «Dicas para Melhorar a Voz» são abordados, de forma sucinta, os principais alicerces da voz. Tópicos como a respiração, dicção, ortoépia, a pronúncia ou a emissão de voz são observados no artigo.


Raquel Pimentel - QuintilianoQuintiliano (Marco Fábio Quintiliano ou Marcus Fabius Quintilianus), romano da antiguidade, professor de retórica, que à parte o seu interesse teórico foi sem dúvida um dos maiores oradores, disse que a dicção, para muitas autoridades, é a verdadeira ação. Em si mesma a dicção possui no discurso um poder maravilhoso e uma grande eficácia, pois não importa tanto a espécie de pensamentos que compusemos na nossa mente, como a maneira em que eles são expressos, visto cada indivíduo, no nosso auditório, ser movido pelo que ouve. Muitas qualidades somenos, quando animadas por uma dicção enérgica, produzirão um efeito mais poderoso do que a mais excelente linguagem destituída desta vantagem.
A dicção, em televisão como em qualquer outro meio de comunicação profissional ou particular, depende em geral de dois fatores - voz e gesto - um dos quais apela para os olhos, e o outro para os ouvidos. Ora, as boas qualidades da voz, tal como todas as outras faculdades, são melhoradas pelo estudo e diminuídas pela incúria.

A evitar


Posturas impróprias ou claudicantes. Em virtude da posição - acanhada - da cabeça, os músculos da garganta e da parte superior do peito estão contraídos. Deste modo a ressonância da voz e, consecutivamente, o poder de expressão ficam diminuídos. Existe um grande número de seminários e cursos destinados a educar a fala. Convido-o a consultar no post «Dicas para melhorar a voz» o resumo de algumas recomendações mais imediatas.

A banir


LaetiteaIndependentemente dos atributos da pessoa empregadora, as operações de charme (mesmo subtis) devem ser banidas de todo. Quem se presta a esse tipo de subterfúgios revela intenções pouco produtivas aos olhos de quem procura valores dignos de referência. Lembre-se que Portugal está a atravessar uma época calamitosa em termos de contratações e poucos são os empregadores (sérios) interessados em suportar despesas consideráveis, mensalmente, em troca das galanteadoras habilidades.

Ainda dentro desta linha: tutear o empregador é outro infeliz atrevimento geralmente fatal. Tenha a idade que tiver quem o está a examinar, a sua concentração passa imperativamente pelo Respeito. Basicamente, como em qualquer relação, não existe trabalho de equipa, ambiente de equipa, cumprimento de horários, dedicação, sacrifícios, qualidade ou confiança se o 'Respeito' não for uma virtude. Ficar bloqueado no meio do trânsito, penalizando uma equipa constituída por 10, 50, 100 ou 1000 elementos, é um irremediável atestado de incompetência, de desrespeito e de traição para muitas empresas sérias. O sucesso de uma empresa passa sempre pela disciplina (coletiva). Qualquer empresa bem sucedida é administrada por pessoal prevenido. Em suma, não se iluda com a aparência, o género ou a idade do empregador, se este for de natureza rígida e implacável, mesmo que a entrevista pareça saudável até ao fim, a ousadia de duas letras apenas (tu) encarregar-se-á de a sepultar.

Conclusão


Antes de qualquer entrevista decisiva, a preparação é imprescindível. Lembre-se de que o presidente, diretor, patrão ou chefe, etimologicamente, é aquele que está à cabeça, ou, melhor ainda, aquele que é a cabeça. A cabeça é que vê, promove ação no interesse comum de todo o corpo. Pense nisso e boa sorte!


A Máquina ou Nós (2ª Parte)


(2ª Parte)


Gödel, diga-se a apego da verdade, não tinha a aparência típica de um revolucionário. Magro, modos pacatos, falava pouco e preferia a solidão. Em Princeton, costumava abrigar-se na cantina para fugir aos visitantes sempre ansiosos por ver uma celebridade como ele. Apesar desses atributos, as suas proposições eram realmente revolucionárias - tanto que provocaram longas e acesas discussões, não apenas entre matemáticos, mas também entre os filósofos. A ideia de que é impossível provar por meios matemáticos que a Matemática não esteja em contradições mudou radicalmente muita coisa. E isso também noutras matérias, como no caso da Física e a Biologia.

Mas eis que uma outra luz se acende no infinito túnel do conhecimento. Recentemente, relativamente, alguns teoremas tidos como indemonstráveis (pelo menos pelos meios ortodoxos) têm sido provados com a ajuda de calculadoras ou computadores. Por exemplo, o teorema das quatro cores. Bastam quatro cores para colorir um mapa (ou uma colcha de retalhos) de modo que nenhum país seja vizinho de outro da mesma cor. Em 1976, os americanos Wolfgang Haken e Kenneth Apple demonstraram isso mesmo, através de um computador durante 1200 horas.

A Máquina ou Nós (2ª Parte) - Raquel Pimentel

Para muitos matemáticos, o uso de computadores em demonstrações desse tipo seria como usar um trator para escavar minuciosamente uma zona arqueológica. Acham que eles produzem uma cadeia finita de verificações, enquanto uma demonstração matemática deve ser breve, clara e concisa. Para mim, isso já é exagero. Encontramo-nos nos tempos modernos e por certo que neste século temos preocupações cuja resposta encontra-se na multidisciplinaridade. Mas é certo que jamais, como hoje, a intuição humana contrapôs-se à lógica mecânica. Quando Gödel garantia que os formalismos são limitados, no fundo estava a provar, em síntese, que o homem é e será sempre superior à máquina. Mesmo que a máquina seja a mais indicada para executar, cabe-nos, a nós humanos, pensar!


Fim



Devido à extensão do texto, resolvi dividir o post em duas partes. Para aceder à primeira parte desta publicação, clique em A Máquina ou Nós (1ª Parte)

A Máquina ou Nós (1ª Parte)


(1ª Parte)


No começo do século anterior, o matemático alemão David Hilbert (1862-1943) propôs uma série de 23 problemas que, previa ele, determinariam o rumo da Matemática nos anos seguintes. Uma frase do texto com que apresentou esses ditos problemas não passou despercebida: ‘Enquanto um ramo da ciência oferecer uma abundância de problemas (a resolver), ele permanece vivo’. Pois bem, em 1931, um então ainda jovem matemático austríaco, Kurt Gödel, apresentou um trabalho de algumas dezenas de páginas, cheias de símbolos, - e nele deixou claro que Hilbert não estava inteiramente certo nas suas conceções.

A Máquina ou Nós - Raquel Pimentel
Kurt Gödel (1906-1978)
Kurt Friedrich Gödel nasceu em 1906 na cidade de Brünn, na época inserida no território austro-húngaro (hoje Brno, sob o domínio à República Checa). Formou-se em Matemática e Física na Universidade de Viana e lá lecionou até 1938. Fugindo da guerra, viajou para os Estados Unidos, tornou-se cidadão americano e integrou-se ao famoso Institute for Advanced Study (Instituto dos Estudos Avançados da Universidade de Princeton). Morreu em 1978, aos 72 anos, e já então era tido como um revolucionário da ciência. A Matemática é considerada uma ciência sem contradições. Supõe-se que quando algo é provado matematicamente, aos olhos da Epistemologia fica irrefutável. Essa ‘crença’ gerou expressões populares do género ’tão certo como dois e dois quatro’. Gödel mostrou que mesmo dentro de um sistema rigidamente lógico, como o que foi desenvolvido para a Aritmética, podem ser formuladas proposições que são indecidíveis ou indemonstráveis, dentro dos axiomas desse sistema. Isto é, dentro do sistema existem enunciados precisos que não podem ser provados nem negados. Portanto, não se pode, usando os métodos comuns, provar que os axiomas da Aritmética não são autocontraditórios.

Essas teorias ou teoremas de Gödel conduziram a um novo ramo da lógica matemática, mais precisamente à teoria da indecidibilidade. Nas suas implicações desmarcadas pela incompletude, a descoberta de proposições indecidíveis foi tão perturbadora no século XX quanto deve ter sido para os pitagóricos, no século IV a.C., a revelação, por Hippasus (ver mitologia), da existência de grandezas incomensuráveis. Mas uma consequência que ultrapassa os limites da Matemática é a que parece condenar um perseguido ideal da ciência: inventar uma coleção de axiomas dos quais todos os fenómenos do mundo natural possam ser deduzidos. (continua...)


Fim da 1ª Parte


Devido à extensão do texto, resolvi dividir o post em duas partes. Para aceder ao resto desta publicação, clique em A Máquina ou Nós (2ª Parte)

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